domingo, 9 de abril de 2023

Notas Filosóficas - Pequena e grande




         Lembro de ter lido que o samurai deve treinar para sacar sua espada da maneira mais decisiva possível, pois a partir do momento que ele a tira da bainha, perde sua iniciativa e o adversário passará a buscar pontos fracos no seu estilo de luta.

       Isso evoluiu nos dias de hoje, de maneira que aquele que de fato atinge o primeiro tiro num combate, seja entre homens, veículos, navios ou aeronaves, pode-se considerar o vencedor da luta, porque as armas de hoje são tão letais que basta qualquer munição atingir que o outro lado é derrubado. Isso se ignorando é claro, que o combate hoje raramente é individual e haverá vários outros combatentes disparando em cada lado da disputa que houver.

       Porém, fica a pergunta: adianta muita coisa o guerreiro treinar ardorosamente sua espada para com ela conseguir dano máximo num possível combate, e saber brandi-la sem revelar sua alma ao inimigo, se ele ignora o fato de que na verdade, todo homem sempre carrega consigo o par de espadas que Musashi propos como padrão? Pelo que entendo, o grande sabre serve para controlar o campo de batalha, impedindo o guerreiro de ser atingido, e podendo ser brandido com duas mãos caso ele queira atingir algo com força máxima.

        Em nossa vida pessoal, nossa profissão, nossa religião, nossa ideologia e nossa família são o grande sabre, a katana que rege nossa existência. O pequeno sabre, a espada companheira, ou wakizashi, serve para suporte, e tentar atingir o inimigo com golpes rápidos.

       Caso o guerreiro fique preso numa casa de teto baixo ou num bambuzal, ele usará a wakizashi como katana, ou até mesmo usará uma tantô ou ponta de naginata se não tiver outro meio. Isso são nossos hobbies, amizades sem grande comprometimento, pequenos vícios que não chegam a ser graves, paqueras que podem gerar alguma faísca mas não vão longe. 

       Posso ter me equivocado quanto ao uso em luta das espadas por nunca ter feito uso delas, mas o que quero dizer é que nenhum homem nunca está sem suas espadas aonde ele vai, ainda que o mandem para lá completamente pelado, ou mesmo que arranquem pedaços dele. Isso talvez torne o iaido inútil: homens não tem bainha para esconder a cor de sua lâmina. 

          Uma espada ou outra arma podem cortar e explodir de tais e tais maneiras. Mas se você dá a um homem que tem um certo tipo de alma, tais e tais armas, ou o treina em tais e tais estilos, a alma dele se sobreporá a tudo isso, seja ela boa, corrupta ou medíocre.     

            Muitas vezes um homem de grande capacidade técnica pode absorver vários estilos, armas e técnicas mas até mesmo os leigos percebem que a alma dele esmaga tudo que está fazendo, e as pessoas não conseguem sentir prazer no que ele faz por muito tempo. Para um homem assim, o iaidô ou qualquer outra técnica que ele usar para mascarar a si mesmo só serve para esconder a decepção que ele causará depois. Algumas pessoas assim se percebem, ou são instruídas por outros, e melhoram, outras mantêm a arrogância e se elevam até serem derrubadas ou caírem em desonra.

             Uma coisa interessante de se observar, é o medíocre que tenta ser alguma coisa: ele tropeça, cai, evolui um pouco em algumas coisas, regride enormemente em outras, mas tanto os que estão acima como aqueles que estão abaixo dele sentem prazer em observá-lo treinar, porque o grande se lembra do que era no passado, e o pequeno observa o que pode tentar ser, o que fazer e o que evitar, no débil que tenta ser alguma coisa.

             A alma dele se torna uma coisa só com o que ele está aprendendo, mas ele não se anula nessa tentativa. Quem o vê exibir sua técnica, percebe que não é perfeita, mas vê que é sincera, e sabe que ele irá melhorar com o tempo. Esse e o iaido perfeito: o da flor que desobrocha lentamente seguindo a estação, no tempo que deve ser.

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